Zeitgeist – tempo, espaço e ressignificação

Poucas palavras encerram tanto conteúdo e amplitude de significações como “ZEITGEIST*”.

A exposição de mesmo nome, com o complemento de Arte da Nova Berlim, em cartaz no Centro Cultural Banco do Brasil no Rio de Janeiro, e com curadoria de Alfons Hug, faz jus à grandeza do termo.

Berlim, sem dúvida, pode ser considerada uma das principais, quiçá a principal, cidade do século XX. Palco central dos dois maiores conflitos do século, representados pelas duas grandes Guerras Mundiais, e lugar de materialização histórica do conflito capitalista-comunista, desde sua gênese até o seu ocaso, com seu emblemático Muro divisor, fazem da cidade “uma verdadeira colcha de retalhos, cheia de fragmentos divididos entre a maldição da memória e as experimentações rumo ao século XXI… abriga tanta história e tantas utopias fracassadas que pode ser considerada a mais pura cidade pós-moderna”, segundo as palavras do próprio Alfons Hug.

É neste contínuo ciclo de construção, desconstrução e ressignificação que reside o grande motor cultural alemão (e também das grandes urbes mundo afora, sujeitas a este mesmo movimento contínuo), formador deste espírito tão complexo e característico.

Este Zeitgeist é representado de forma pujante nas obras da exposição e pelos seus eixos temáticos: Tempo que corre e tempo estagnado, A ruína como categoria estética, Eterna construção e demolição, O vazio e o provisório, Hedonismo cruel e Novos mapas e os outros.

Estes eixos, por si só, já servem como “trilha” explicativa perfeita para entendimento destes tempos.

Temas como espaço e tempo, predicados basilares do conceito de Zeitgeist, encontram espaço de destaque na produção de Michael Wesely.

Imagem -Michael Wesely

Michael Wesely

A valorização estética da destruição, do abandono e da devastação impingida pelo homem no seu meio social e, especialmente, urbano, revela os traços estruturais de uma sociedade que parece umbilicalmente ligada a este eterno movimento de ressignificação. Frank Thiel e Thomas Florschuetz representam de forma contundente esta proposta.

Imagem - Frank Thiel (2)

Frank Thiel

Imagem - Frank Thiel (1)

Frank Thiel

Imagem -Thomas Florschuetz

Thomas Florschuetz

Conjugando espaço, tempo e este contínuo movimento de ressignificação encontramos a síntese proposta pela obra de Julius Von Bismarck e Julian Charrière – um conjunto de betoneiras que, num intento furioso de mudança, apropriam-se de fragmentos de demolições de construções berlinenses, transformando-os, por meio de seu processamento maquinal, em seixos e, finalmente, pó: base de uma nova possibilidade de construção.

Imagem - Julius Von Bismark e Julian Charrière

Julius Von Bismarck e Julian Charrière

Estes espaços em suspenso, paradoxalmente destruídos e úteis ao mesmo tempo, conjugam uma espécie de crueldade lírica e prazerosa. Obras como as de Martin Eberle revelam locais em ruínas que servem de palco para interação social, festas e produção artística.

Imagem - Martin Eberle

Martin Eberle

Temos, portanto, um poderoso exemplo de que a produção artística, em suas diversas plataformas, constitui uma das principais formas de representação material deste Zeitgeist. As primorosas curadoria e montagem desta exposição, trazida ao público pelo CCBB, só tornam mais fácil compreender esta relação.

 

* Zeitgeist, em uma das suas concepções, (inclusive, aquela adotada pela curadoria da exposição) é um termo alemão que caracteriza o conjunto do clima intelectual e cultural numa certa época, ou, ainda, características gerais de um determinado intervalo de tempo a partir do qual a arte, a cultura e as relações humanas evoluem.

Deixe um comentário