A Fotografia como Fonte de Conhecimento Histórico

A fotografia propicia um vasto campo de possibilidades e conhecimento. Contudo, considerando os interesses deste post, delimitações de abordagem se fazem necessárias. Não serão abordadas questões inerentes à história da fotografia, das técnicas fotográficas ou de pormenores especializados do tema. Nossa abordagem estará focada na fotografia como fonte de conhecimento histórico, resguardadas, evidentemente, todas as considerações críticas necessárias para esta apropriação.

A informação contida numa fotografia é extremamente rica e indicial, contudo, por outro lado, revela certa parcialidade. Ela não deve ser confundida objetivamente com o tema representado, antes de tudo ela é apenas o vestígio deixado pelos atores envolvidos num dado momento (KUBRUSLY, 1983).

Robert Capa

Robert Capa

Vale ressaltar a importância assumida pela fotografia na sociedade moderna, ocupando o papel anteriormente denotado à pintura no campo da documentação de caráter imagético, entretanto, a fotografia confere uma sabedoria “aparente”, sendo, portanto, necessário desmitificar a (falsa) percepção sobre a apropriação do real pelo fotógrafo. Os níveis de verdade se dão em diferentes graus, seja no aspecto prático ou conceitual (SONTAG, 1986).

Como ponto seminal de discussão encontram-se alguns princípios sobre a natureza da fotografia: (i) a fotografia como registro da realidade, ou seja, um meio de representação mimético, representando uma espécie de espelho do real; (ii) a fotografia como transformação da realidade, baseada no discurso do código e da desconstrução; e (iii) a fotografia como um traço do real, baseada no discurso de índice e referência (DUBOIS, 1994).

Robert Capa

Robert Capa

Independentemente dos princípios que podem norteá-la, a ideia de plena semelhança da imagem ao seu referente foi superada. Na visão de Dubois, a fotografia apresenta alguns corolários importantes: a singularidade, ou seja, a existência de um único negativo, independentemente da quantidade de cópias que se deseja obter; a atestação, na medida em que, na sua gênese, confirma ontologicamente a existência daquilo que mostra e, por último, o da designação, intimamente relacionado ao referente, que revela o traço indiciário.

A complexidade na análise conceitual sobre o papel da fotografia se aproxima do limite do inclassificável, pois ela reproduz um momento que poderá ser repetido mecanicamente por muito tempo de algo que não se repetirá existencialmente nunca mais. Ela revela mais do que o simples objeto, ela revela também questões sobre determinado tempo. A fotografia traz consigo uma abordagem contingencial, sempre representando alguma coisa, uma espécie de emanação do referente e, devido a isso, fornecendo detalhes que constituem um material de saber etnológico que revelam e propiciam o acesso a uma espécie de infra-saber. A fotografia transmite um aspecto da experiência humana compartilhada, contemplando três atores principais: o fotógrafo, operador da ação, nós, os espectadores das fotografias e coleções (Spectator) e aquele que é fotografado, o alvo, o referente (Spectrum) (BARTHES, 1985).

Robert Capa

Robert Capa

Especialmente no que se refere ao conceito de mimese e da pseudo-objetividade da fotografia, reforça-se seu estatuto de algo codificado sob os mais diversos aspectos, sejam eles técnicos, culturais, sociológicos ou estéticos. Vale ainda lembrar que a fotografia prefigura o estereótipo instrumental constituidor do mundo contemporâneo, e que a sua importância se reforça na medida em que vem a substituir o predomínio dos textos e dos conceitos próprios à sociedade industrial (FLUSSER, 1985).

É nesta perspectiva, especialmente no sentido de complementar ou suplantar a predominância da fonte textual, que podemos nos valer da riqueza de sentidos e significados presentes nos registros fotográficos para construção do conhecimento histórico.

Apoio Bibliográfico:

KUBRUSLY, Cláudio. O que é fotografia. São Paulo: Brasiliense, 1983.

SONTAG, Susan. Ensaios sobre fotografia. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1986.

DUBOIS, Philippe. O Ato Fotográfico. São Paulo: Ed. Papirus, 1994.

BARTHES, Roland. A Câmara Clara: nota sobre a fotografia. Rio de Janeiro: Nova Fronteira: 1985.

FLUSSER, Vilem. A filosofia da caixa preta. São Paulo: Hucitec, 1985.

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